domingo, 31 de outubro de 2010

Eu e o trem

Eu a perdi por besteira. Os meus planos, meus pobres enganos, por besteira.
Não que tenha sido maldade dela, não foi. Foi só uma besteira.
Não me importa que eu tenha tido os meus gastos nesse tempo tão breve, pelo contrário! Eu só fico com um remorso prévio, por todos os gastos que eu queria ter no futuro. Os restaurantes, que eu planejei leva-la, quando minha mesada se acumulasse no suficiente. Nos parques que eu me lembrei que ia quando criança, e que ela certamente adoraria. Eu queria muito ir com ela ao boliche, ao aniversário da minha avó, que tem estado muito mal e não lhe restam muitos, ao revéillon que eu pretendo passar na fazenda do meu melhor amigo e que as cinco da manha eu a acordaria de surpresa para tirar leite das vacas, acompanhados pelo caseiro das mãos docemente encardidas.
Mas ela tomou seu caminho contrário ao meu, e foi por besteira.
Eu não me arrependo de ter viajado com ela aquela vez, para Minas Gerais, e nem me envergonho de ter vomitado pela janela todo o vinho que eu ingeri por ser afobado. Eu só fico aflito em pensar em todas as viagens que eu programei no meu íntimo. Campos do Jordão, Gramado, Jalapão, Buenos Aires, Califórnia, Guaruja, Garopaba. Todas as pousadas cuidadas por um casal qualquer de aposentados contentes da vida, os albergues, os resorts, os motéis. Mas não existem mais viagens, e não existem por besteira.
Eu não me arrependo de ter sido inconveniente com piadas fora de hora, nem com as mazelas que eu usei me referindo aos ídolos dela, nem com a minha impaciência ao telefone. Eu me arrependo de não ter curtido com mais gosto todos esses pormenores. Mas esses pormenores agora são menores ainda, afinal, ela resolveu continuar sem mim, pautada numa besteira.
Não que eu queira diminuir tal "besteira", não é o caso. Talvez eu tenha que reajustar meus valores para admitir melhor o que é ou não perdoável, e assim poder medir melhor as consequências. E eu me proponho a enfrentar esse dilema, com qualquer força minha.
Por que?
É puramente por que o amor que eu mais depositei confianças me deixou, e de recordação eu tenho uma foto. Uma foto apenas. Sentados no caminho entre Ouro Preto e Mariana, num trem velho que me fez gelar de medo. E nós sorriamos, sorriamos com gosto, com uma inocência que eu sei que eu ainda guardo, e que posso transmitir a essa moça, com total dedicação. Uma foto apenas.
E aquela aliança que eu mais tive esperanças vai para o fundo da gaveta sem nem ter o nome dela gravado. Sem nem ter o seu nome gravado. E ela vai junto com aquela foto, aonde nós sorriamos no trem. Esse trem que agora, me leva sozinho, por conta de uma besteira.

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